Nesta semana estivemos, eu e outros economistas, informalmente discutindo o problema da educação. Alguns pontos:
i. Easterly disse, com razão, que educação não importa para o crescimento econômico, embora haja, sim, uma forte correlação entre níveis de educação e renda (aqui, leitor, fica clara a importância de se entender bem conceitos básicos de estatística, matemática e economia).
ii. Por que tantos alunos estudando e o PIB não cresce? Bom, a pista está aí em cima. Mas vale a pena pensar nos incentivos microeconômicos que explicam o comportamento das pessoas. É um fato geralmente notado por gente de minha idade que os alunos universitários de hoje adoram fazer mais de um curso superior. A idéia é sinalizar para os empregadores que se é “flexível”, “versátil”, “melhor que o concorrente” na vaga que se almeja. Ocorre que o dia, desde antes de Cristo, continua tendo 24 horas, o que significa que, em média, um indivíduo que teria um ótimo desempenho em um curso, tem um desempenho pior quando divide seu tempo para estudar, em média, o dobro de matérias. Que capital humano você pensa que está sendo formado neste caso?
iii. Existe outra forma de sinalizar para o mercado. Esta consiste em se fazer uma especialização, um MBA, algo assim. A idéia é que o empregador olhe pro curriculo do cara e fique impressionado. Alguns se queixam que a existência de cursos “picaretas” como um resultado desta demanda. Isto é um problema entre empregador (que é bobo de pagar mais por um insumo de qualidade inferior) e do empregado (que sabia muito bem pelo que pagava quando escolheu a faculdade “picareta”). Claro que é ruim lecionar em faculdades “picaretas”, mas isto não é motivo para se restringir a abertura de cursos. O pior que pode acontecer é o cara melhorar sua formação em, digamos, X%, enquanto o aluno sério aumenta em X*100000% (ou algo assim).
O argumento em iii é explicado pelo modelo de sinalização – cada vez mais ensinado em cursos de graduação (“picaretas” ou não) de Economia do Brasil. Claro que, para entendê-lo bem, você precisa entender um pouco de matemática, algo que cursos de economia “picaretas” tendem a desprezar.
Existe gente – com boa formação – que se queixa de ter o mesmo título que um cara que fez um MBA “picareta”. Ele suspira e diz: “puxa, eu ralei, estudei de verdade, fiz sacrifícios, e este cara tem o mesmo status que eu”. É em um caso destes que você esperaria do MEC uma discriminação, claro. Mas veja o quanto isto é improvável: regulações são sujeitas a todos os tipos de pressões e o que o MEC fez com o Provão mostra bem isto.
Sobra, finalmente, para o mercado. Eu sempre digo que Adam Smith estava certo quando falou que a “extensão do mercado é uma função da divisão de trabalho”. Quando vejo o mercado mineiro, não vejo um mercado tão extenso assim que permita selecionar eficientemente a mão-de-obra. A impressão que passa é que tanto faz para alguns ramos da economia empregar um bom profissional e um mau profissional. Claro que isto ocorre em qualquer estado de qualquer país, mas a impressão anedótica é que isto é mais forte aqui do que no Rio de Janeiro ou em São Paulo.
A solução, portanto, passa pela receita da vovó: mais crescimento econômico baseado em competitividade. Quando empregadores precisam melhorar o produto, a qualidade do insumo passa a ser importante. Em um ambiente como este, práticas “picaretas” e alunos “picaretas” tendem a ser remunerados pela sua produtividade marginal e o mesmo vale para os bons alunos.
É fácil ver isto na prática. É comum ouvir na rua: “meu MBA não vale muita coisa. Todos estão fazendo. Preciso de um mestrado”. Isto me lembra um debate em que estive junto a um empresário do setor privado de ensino. Falando para alunos do colégio, ele dizia: “que é isso, não precisa fazer mestrado acadêmico assim que forma! Primeiro trabalhe, viva, aí decida”.
Para ele, claro, é um bom argumento. Quanto mais o cara trabalha, mais ele não deseja alocar seu tempo para o estudo (além do que ele se casa, faz dívidas, etc). Obviamente, este sujeito tenderá a fazer MBAs (ofertados, dentre outros, pelo meu colega debatedor) e, quando vir que todos estão fazendo isto, desembolsará mais grana para um mestrado profissional, etc.
Eventualmente, concluirá que o topo da carreira seria o mestrado acadêmico, sugestão deste que vos fala. Mas aí será tarde. O cara já estará cansado, com outro estilo de vida, filhos…conseguirá encarar o doutorado? Dificilmente. Estará mal acostumado com o ritmo leve de cursos noturnos, pouca leitura, será difícil escapar deste modo de vida. Não é, claro, impossível. Mas é muito difícil.
Resumindo: educação não é sinônimo de crescimento econômico e nem todo mundo que procura mais cursos pós-graduação está em busca de aperfeiçoamento. Se puder, enganará o patrão trabalhando pouco e “arrotando” conhecimento. A solução não é fechar cursos de especialização ou proibir MBAs. A solução é explicar para as pessoas e dizer a elas que devem fazer suas opções livremente, arcando com seus custos de maneira adulta, digo, responsável.
Como sempre, leitor, eu não sei se me expressei claramente. Portanto, comentários são bem-vindos.
Claudio
p.s. UPDATE: Embora não tenha visto antes, Pedro Sette Câmara está com interesse similar ao meu no tema.
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